Por Silvana Azevedo
Ignorando o alcance da internet e desconhecendo a legislação, muitos jovens expõem sua privacidade sem cautela, usam redes sociais antes da idade permitida, praticam e sofrem bullying virtual. Saiba como ajudá-los a se proteger.
Em 2009, um vídeo com cenas de sexo entre adolescentes, gravado em uma escola em Belém do Pará, chegou à internet, causou indignação, chocou pais e professores e preocupou psicólogos. “O relato que eu tive do educador que acompanhava o caso foi de que o vídeo circulou na cidade toda, em muitas escolas e, ao invés de gerar constrangimento, fez com que os envolvidos se tornassem microcelebridades no contexto escolar”, conta o psicólogo Rodrigo Nejm, da associação SaferNet. Em sua opinião, o caso estimulou outros adolescentes a também fazer esse tipo de vídeo. “Para eles, teve um efeito positivo. Isso me surpreendeu muito”, afirma.
Em vez de apontar os meios de comunicação digitais e as redes sociais como vilões, o especialista entende que esse tipo de comportamento não é fruto da internet, mas sim de uma sociedade que supervaloriza a exposição do corpo e da erotização precoce da infância e da adolescência, o que pode ser visto em contextos como a música, o cinema, a televisão e a moda. “De certa maneira, os jovens só estão respondendo a esses estímulos e reproduzindo os conceitos culturais presentes nas outras mídias”, acredita.
Fundada em 2005 por um grupo de cientistas da computação, professores e bacharéis em Direito, a SaferNet é uma referência nacional no tratamento aos crimes e violações aos direitos humanos na internet. Rodrigo Nejm é diretor de prevenção e trabalha no sentido de provocar esse tipo reflexão, partindo para uma postura mais proativa nas escolas, incorporando questões de ética e cidadania na pauta curricular.
Cerca de 20 mil educadores já participaram do programa da SaferNet, porém ainda há muito a ser feito nesta área. De acordo com a instituição, o Brasil é um dos países onde as crianças e os adolescentes passam o maior número de horas diante das telas de celulares, computadores e televisores. “As estatísticas demonstram que o uso intenso é limitado ao lazer e ao entretenimento”, revela Nejm. “Também ficou explícito nas pesquisas que eles não dominam as próprias ferramentas das redes sociais”, relata o psicólogo, que cursa doutorado em gerenciamento da privacidade em ambientes digitais na Universidade Federal da Bahia (UFBA). Para ele, este é um risco, pois a maioria dos usuários demonstra que não lê os termos de uso dos sites e desconhece as ferramentas de configuração de privacidade. Além disso, o adolescente não se dá conta da dimensão do que publica nas redes sociais e acaba, muitas vezes, em situação vulnerável.
A idade é outro problema, já que menores de 13 anos não estão autorizados a criar perfis na maior parte das redes sociais. Segundo a advogada Guataí de Paula, especialista em direito digital, uma pesquisa realizada pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil mostra que 25% das crianças e dos adolescentes brasileiros entre 9 e 16 anos não só têm um perfil na rede social, como ele ainda é aberto ao público: 57% delas informam a idade, o que pode ser considerado um ato infracional, previsto no artigo 299 do Código Penal.
Responsável pelo iStart, instituto fundado pelo escritório Patrícia Peck Pinheiro Advogados, que oferece aos jovens conteúdos relacionados a ética e segurança digital, Guataí alerta para a importância de educá-los para o uso da internet. O movimento Criança Mais Segura na Internet (www.criancamaissegura.com.br), que integra o iStar, tem como objetivo principal a educação de crianças, jovens, pais e professores, por meio da orientação para o uso seguro das ferramentas digitais. No site do movimento são disponibilizados gratuitamente vídeos e cartilhas que ensinam a comprar com segurança na internet, a adotar posturas adequadas nas redes sociais e outras condutas importantes. As escolas podem solicitar palestras de conscientização sobre o uso ético, legal e seguro das tecnologias digitais.
Responsável pelo iStart, instituto fundado pelo escritório Patrícia Peck Pinheiro Advogados, que oferece aos jovens conteúdos relacionados a ética e segurança digital, Guataí alerta para a importância de educá-los para o uso da internet. O movimento Criança Mais Segura na Internet (www.criancamaissegura.com.br), que integra o iStar, tem como objetivo principal a educação de crianças, jovens, pais e professores, por meio da orientação para o uso seguro das ferramentas digitais. No site do movimento são disponibilizados gratuitamente vídeos e cartilhas que ensinam a comprar com segurança na internet, a adotar posturas adequadas nas redes sociais e outras condutas importantes. As escolas podem solicitar palestras de conscientização sobre o uso ético, legal e seguro das tecnologias digitais.
A SaferNet também tem criado instrumentos pedagógicos para as escolas a fim de levar os jovens a refletir sobre o tema, pensando bem antes de divulgar uma informação em um ambiente que reúne bilhões de pessoas. Para Rodrigo Nejm, o grande desafio é conectar a educação para o exercício da cidadania, o exercício dos direito humanos e o respeito à diversidade. “Pais e professores podem não saber usar tão bem a internet como os filhos e os alunos, mas certamente têm um domínio maior, ou deveriam ter, sobre as noções de cidadania”, adverte. “A criança pode aprender sozinha a usar o Facebook, mas não aprende sozinha a ter cuidados nos ambientes públicos”.
Socorro on-line
Além de dialogar com as escolas, desenvolver videoaulas e cartilhas e promover palestras, a SaferNet inaugurou mais uma frente de trabalho em 2012. Trata-se do HelpLine (www.canaldeajuda.org.br), um canal que possibilita a pessoas de qualquer lugar do Brasil falar on-line, das 13h às 19h, ou por e-mail, 24 horas por dia, com um psicólogo especializado, sem qualquer tipo de custo. “Em um ano já tínhamos mais de mil pedidos de ajuda”, informa a psicóloga Juliana Cunha, coordenadora do programa, que atende ocorrências que vão do arrependimento de postagem de um conteúdo gerado pelo próprio usuário a situações de sexting (exposição de fotos íntimas ou de conteúdo sexual).
Ofensas, discriminação étnica, intimidação e ameaças, o chamado cyberbullying, também são recorrentes, e a profissional explica que, muitas vezes, o canal é acionado por adolescentes que temem contar para os pais. “O cyberbullying é diferente do bullying e ainda mais nocivo, porque o constrangimento não fica restrito a um espaço físico determinado, como a escola”, destaca. “Para onde quer que o indivíduo vá, o problema vai junto. As vítimas sofrem consequências que afetam a sua vida social, os seus relacionamentos e a sua saúde”, explica Juliana, que, além de dar suporte psicológico, também orienta a respeito de questões legais.
Segundo a especialista, para muitos adolescentes, existir é estar na rede. Ela alerta, porém, que esse comportamento requer cuidados redobrados e que gerenciar a própria privacidade tornou-se um desafio. “Antigamente as pessoas cometiam ou falavam pequenas bobagens na adolescência e as histórias caíam no esquecimento ou se transformavam em motivo de risos nos encontros de amigos. Hoje não se tem mais direito ao esquecimento”, ressalta.
Registro permanente
Essa opinião é compartilhada pelo sociólogo e educador em mídias e tecnologias educacionais Yuri Bastos Wanderley, coordenador geral da Rede Anísio Teixeira do Estado da Bahia. “Na internet, a informação fica registrada permanentemente, não se pode voltar atrás no que foi dito, e o dado está acessível a qualquer pessoa, a qualquer momento”, observa. Ele também lembra que muitas opiniões tendem a mudar no decorrer da vida, por isso é preciso tomar cuidado com os posicionamentos publicados nas redes sociais. Por isso, defende que os valores éticos de um indivíduo devem ser replicados da vida real para o mundo virtual, embora os diferentes espaços requeiram comportamentos diferenciados.
“O nosso dever, como educadores da rede pública, é educar para a ética cidadã. É uma educação que vai para além da sala de aula”, afirma.
O Instituto Anísio Teixeira, vinculado à Secretaria de Educação, oferece programas de difusão das mídias e tecnologias da informação e da comunicação na rede de ensino para formar professores dos núcleos de tecnologia educacional e professores de projetos pedagógicos, os quais desempenham o papel de multiplicadores. Assim, os ensinamentos chegam às 1.400 escolas estaduais, através dos 36 mil professores da rede, beneficiando 1,2 milhão de estudantes. Videoconferência são realizadas em parceria com a SaferNet, que promove debates e discussões a respeito do uso seguro e ético da internet, disponíveis para qualquer educador da rede estadual da Bahia. “Entendemos que os novos meios de comunicação tecnológica são mais uma forma de expressão da nossa sociedade, mais um espaço onde as pessoas estão se encontrando, se relacionando e construindo coisas em comum. Contudo, as redes sociais não substituem as relações face a face”, observa Yuri Bastos Wanderley.
Em sua trajetória como educador em tecnologia, o coordenador da rede Anísio Teixeira reuniu subsídios para analisar o comportamento dos jovens na internet e verificou que aqueles que têm dificuldade de se socializar nas relações do bairro e da escola acabam transferindo as expectativas para o mundo virtual, criando perfis que valorizam suas qualidades e escondem características que muitas vezes os fazem sofrer bullying nas relações presenciais. “É importante analisar por que o jovem prefere passar o tempo dele na internet. Será que a internet é perfeita? Ou será que as relações que ele mantém fora são repressoras? O uso excessivo da internet talvez seja uma consequência da maneira como as pessoas estão se relacionando fora dela”, alerta.
Liberdade vigiada
O subsecretário de Novas Tecnologias Educacionais da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, Rafael Parente, vê a internet como uma ferramenta muito recente, em constante transição, e acredita ser necessário um processo de educação que torne os jovens mais críticos e conscientes: “A ética, que já é tão rara no mundo presencial, é praticamente inexistente no mundo virtual”. Ele aposta no desenvolvimento de habilidades e competências para que os educadores possam apropriar-se das ferramentas tecnológicas da melhor forma possível.
Para isso, a Secretaria Municipal do Rio de Janeiro desenvolveu um curso on-line para os professores da rede, o Transformação 3.0, cujo conteúdo aborda temas relacionados a segurança na rede, ética e riscos a que os usuários estão expostos. “Acreditamos em um processo de educação complexo, trabalhoso, que exige diálogo e reflexão”, diz o subsecretário. “Também vemos a proibição como um caminho mais curto e menos eficiente, por isso a melhor atitude a se tomar é trabalhar com uma conscientização aprimorada para que os alunos se tornem autônomos, conscientes dos limites para suas ações e seus comportamentos”, explica.
Esse método já é aplicado no Ginásio Experimental das Novas Tecnologias Educacionais (GENTE), escola instalada na Rocinha, cujo ensino é personalizado, sem separação de turmas, e tornou-se possível graças ao uso intensivo do computador. Nessa escola, quanto mais o aluno prova que é responsável, mais o professor o deixa livre. Quando existem excessos, como o acesso a páginas indevidas, o estudante sofre consequências, que variam de acordo com a gravidade.
Os computadores não têm filtros, mas há softwares que permitem ao professor enxergar as telas de todos os alunos. Segundo o subsecretário, em toda a rede municipal de ensino há 670 mil alunos, e as ocorrências oscilam entre 10 e 30 por mês. “Não podemos ir pelo caminho mais fácil e pensar que, se temos problemas, devemos proibir e abrir mão dos recursos tecnológicos”, observa. Para ele, também é papel dos educadores propor esse tipo de educação e de reflexão na escola. “É um desafio essencial para o futuro dos nossos alunos. Eles usarão essas ferramentas e precisarão estar conscientes de que devem agir com civilidade também no mundo on-line”, afirma Parente.
Como usar a internet de maneira ética e segura
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Fonte: https://www.grupoa.com.br/revista-patio/artigo/9909/os-perigos-da-rede.aspx
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