Por Luciano Meira
A missão da escola é criar ambientes físicos ou virtuais de aprendizagem capazes de fomentar o interesse dos alunos pelos conteúdos do currículo.
Os contextos interacionais e de circulação de conteúdos na escola de ensino médio são naturalmente complexos, pois resultam da articulação de diferentes dimensões, incluindo as formas próprias de participação social e engajamento cognitivo dos jovens, a história cultural da instituição escolar, a experiência singular dos educadores, a atualização cotidiana de currículos e práticas didáticas, além de muitas outras condições emergentes.
O sucesso ou fracasso da articulação dessas diferentes dimensões depende mais das metáforas e premissas educacionais que regulam e direcionam estrategicamente os espaços físicos e simbólicos da escola e menos dos artefatos específicos que habitam o cenário tecnológico do ambiente escolar, sejam analógicos (como livros didáticos em papel, por exemplo), sejam digitais (como qualquer instrumento ou ambiente computacional: smartphones, por exemplo), sendo que o uso que se dá a essas tecnologias depende das metáforas pedagógicas em curso.
Possivelmente, devem falir todos os modelos de educação escolar baseados em metáforas de “transmissão do conhecimento”, “absorção de informação”, “retenção da aprendizagem”, “seriação” como modo de hierarquizar conteúdos e “controle” como modo de hierarquizar pessoas ou papéis na sala de aula. A aula baseada nessas metáforas é restritiva e desinteressante aos propósitos de alunos e professores. A aula como metáfora faliu; porém, mesmo metáforas potencialmente mais adequadas ao mundo escolar, como aquelas inspiradas nos modelos construcionistas de todas as origens teóricas, não nos ajudarão a produzir uma ambiência educacional de alto desempenho e engajamento de alunos e professores se não forem abertas às expressões culturais contemporâneas, às formas de vida próprias dos jovens de agora, às preocupações mais comuns e atuais dos seus professores.
O centro e a periferia das manifestações mais autênticas e legítimas da juventude hoje se espelham na cultura de mídias, em arranjos sociais construídos nas redes sociais virtuais, na mobilidade da comunicação, na diversão como meio de aprendizagem. Contudo, diferentemente do mundo real fora da escola, o mundo real da escola aliena dos jovens os artefatos e atividades da cultura digital da qual são nativos. Ao retiramos sua ambiência singular de produção de sentidos, ao subtrairmos a cultura de mídias, criamos uma escola alheia aos propósitos dos jovens e cega às suas modalidades de engajamento social e aos seus modos de aprendizagem. Podemos fazer diferente em termos da produção de um novo conjunto de práticas educacionais e metáforas pedagógicas capazes de acolher o engajamento animado de alunos e professores?
Gostaria de propor quatro campos de atuação para a cultura digital no ensino médio, organizados como na figura. Trata-se da criação de cenários de aprendizagem através de plataformas imersivas, em contextos comunicativos de redes sociais, enriquecidas pela possibilidade de virtualização do conhecimento através de nuvens de aplicativos, tudo isso organizado de sorte a produzir dados que geram inteligência educacional para a escola. Comento na sequência cada um desses campos da cultura digital como vetores de inovação na escola de ensino médio.
1. Imersão: plataformas de aprendizagem
A escola, historicamente, tem-se ocupado em especial do ensino na forma da apresentação de conteúdos. Tal prática, comumente monológica, com o professor no centro da “transmissão do conhecimento” (uma das metáforas clássicas da escola), produz um divórcio entre o ensino e a aprendizagem, como se esta última fosse menos responsabilidade da escola. O contrário deveria ser o caso: a principal missão da escola deveria ser garantir a aprendizagem dos alunos, ainda que para isso fosse necessário ensinar.
Mais que isso, acredito que a missão da escola seja criar ambientes imersivos de aprendizagem capazes de fomentar o interesse dos alunos pelos conteúdos do currículo, seu engajamento em modalidades diversificadas de pesquisa e produção criativa de conhecimentos, seja valorizando o vínculo entre professores e alunos, seja fomentando novos arranjos sociais na sala de aula. Físicos ou virtuais, esses ambientes deveriam funcionar como plataformas nas quais “plugamos” inovações didáticas fundadas na cultura de mídias, cuja linguagem está no imaginário e no cotidiano dos alunos de ensino médio.
Por exemplo, o uso de processos de “gamificação” (através da aplicação de elementos do mundo dos games a processos específicos do mundo da escola) pode ajudar a transformar a vida escolar em uma aventura imersiva de aprendizagem, como o faz a escola Quest to Learn (www.q2l.org), nos Estados Unidos, ao montar aulas de todas as disciplinas com foco na ludicidade e narratividade típicas dos videogames. Ainda no campo das práticas imersivas de aprendizagem e na perspectiva das plataformas digitais, temos o poder de escalabilidade dos massive online open courses (MOOCs), cursos multimídia abertos na internet para grandes audiências, e das plataformas lúdicas de aprendizagem, com foco na construção de competências e na aprendizagem de conteúdos específicos, como é o caso, aqui no Brasil, do trabalho que realizamos com as Olimpíadas de Jogos Digitais e Educação (OJE: www.joystreet.com.br).
Em qualquer desses casos, o que está em jogo nessa dimensão é o design de ambientes instrucionais capazes de mobilizar e garantir a adesão de alunos e professores em um processo de aprendizagem rico em perguntas interessantes, argumentos plausíveis e respostas que explorem a curiosidade dos atores envolvidos.
2. Comunicação: redes sociais
A segunda dimensão trata do reconhecimento do diálogo como matriz da aprendizagem significativa e da participação legítima de alunos e professores na vida escolar. A escola é basicamente um conjunto de microrredes de interação presencial, com enorme potencial para a emergência de redes sociais virtuais distribuídas entre alunos e professores, no contexto das quais seria possível, em tese, fazer circular toda a informação e alguns processos de aprendizagem desejados pelos formuladores de currículo. O potencial existe porque, fora da escola, tanto os alunos quanto os professores já habitam muitos desses espaços de comunicação e diálogo virtualizados: o Brasil figura entre os países com maior número de usuários e de interações em ambientes como Facebook e YouTube.
Existem muitas questões em debate acerca do uso de redes sociais na escola, da manutenção da privacidade dos jovens e dos professores à eficácia como canal de ensino e aprendizagem. E existem na internet dezenas de recomendações acerca dessas questões (procure no Google, por exemplo, “facebook para educadores”). Gostaria apenas de enfatizar que se deve evitar o aproveitamento das redes sociais como (mais um) instrumento de controle dos atores da educação na escola e, caso não se usem as redes virtuais, por qualquer das questões já mencionadas, deve-se procurar ao menos apropriar-se de seu estilo comunicativo, dos memes e personagens criados pelos jovens para divertir, informar, argumentar, organizar, aprender.
3. Virtualização: nuvens de aplicativos
As estatísticas mais atuais da distribuição de smartphones e tablets e de acesso móvel à internet no Brasil são surpreendentes de uma maneira bastante positiva. Por exemplo, somos líderes mundiais no tempo de uso diário de aparelhos móveis (84 minutos contra 74 minutos da média mundial) e perdemos apenas para a Coreia no acesso médio diário aos mais diversos tipos de aplicativos para comunicação, notícias, entretenimento e educação, entre outros.
Ainda assim, da mesma forma que dificultou a entrada do Tamagotchi no Brasil na década de 1980, a escola hoje se esforça para limitar o uso da computação móvel em seus espaços, enclausurando os jovens nos já ultrapassados “laboratório de informática”. Conectados a uma rede Wi-Fi e providos da função “modo avião”, que bloqueia a comunicação via ligação telefônica e o recebimento de mensagens por SMS, esses aparelhos podem tornar-se instrumento de uma aventura educacional sem precedentes na escola, funcionando ao mesmo tempo como “veículo” e “sonda” da jornada que articula professores, alunos e conhecimentos.
Como veículo, esses recursos são capazes de conduzir os atores dos sistemas de educação às plataformas de aprendizagem e comunicação. Existem milhares de aplicativos úteis à escola e ao ensino (ver, por exemplo, esses poucos, mas muito interessantes, no link bit.ly/escolapps), em torno dos quais podemos montar incontáveis novas práticas didáticas de apoio à aprendizagem (ver, por exemplo, o uso do acelerômetro de smartphones em uma atividade sobre força centrípeta em bit.ly/escolapps1 e bit.ly/escolapps2).
Como sonda, essas ferramentas podem devolver-nos o rastro de aprendizagem deixado pelos usuários dos sistemas de informação, com o qual criamos inteligência educacional, marcado no círculo central da figura e discutido a seguir.
4. Inteligência educacional
Finalmente, como parte da arquitetura necessária ao entendimento e reinvenção inovadora dos processos de ensino e aprendizagem na escola, coloquei no centro as atividades de monitorar e gerar novos conhecimentos acerca de todas as outras atividades de alunos e professores nas camadas de imersão, comunicação e virtualização. Realizada com base em algoritmos proprietários e sob a tutela de conceitos da moda como Big Data, ou realizada com o apoio de instrumentos de análise de dados disponíveis na internet (como o Qedu em www.qedu.org.br), o importante nessa dimensão está na capacidade de agir rapidamente em função da atividade dos alunos e professores nas plataformas de aprendizagem, nas redes sociais e nas nuvens de aplicativos que formarão os novos sistemas de educação.
Uma arquitetura de escola baseada nas dimensões antes discutidas pressupõe um processo contínuo de inovação. Em educação, os processos de inovação deveriam estar vinculados principalmente à criação de ambientes que incentivem a criatividade, a imaginação, a experimentação, a exploração engajada e desejante, capazes de capturar a atenção e o imaginário de alunos e professores. Assim, a inovação na escola pode ser realizada na forma de aulas que acontecem em redes sociais ou, bem ao contrário, pela abolição da aula como arranjo social adequado à aprendizagem.
Por isso, tenho convidado alunos e educadores para o que chamo “hackear a escola”, ou seja, criar plataformas diferenciadas e contextualmente relevantes para a aprendizagem, que apoiem a emergência, em escala, de novos arranjos sociais para a educação. Os requisitos para tal empreendimento incluem desde uma gestão preparada para entender as demandas e tendências de uma cultura digital cada dia mais entranhada no cotidiano dos jovens até a habilitação dos professores à escuta e ao diálogo com seus alunos, passando por questões bem mais simples, como o provimento de banda larga em rede Wi-Fi e de programas tecnológicos do tipo BYOD (bring your own device), que incentivam na escola o emprego dos artefatos de que o jovem já dispõe e dos quais faz uso fora dela.
Penso que a transição de uma escola da manutenção de pressupostos e metáforas seculares para uma escola da reinvenção de sua arquitetura pedagógica e institucional poderia empregar diferentes tipos de inovação para diferentes partes da atividade escolar, num modelo do tipo 70-20-10, que poderia iniciar assim no ano 1:
O sucesso ou fracasso da articulação dessas diferentes dimensões depende mais das metáforas e premissas educacionais que regulam e direcionam estrategicamente os espaços físicos e simbólicos da escola e menos dos artefatos específicos que habitam o cenário tecnológico do ambiente escolar, sejam analógicos (como livros didáticos em papel, por exemplo), sejam digitais (como qualquer instrumento ou ambiente computacional: smartphones, por exemplo), sendo que o uso que se dá a essas tecnologias depende das metáforas pedagógicas em curso.
Possivelmente, devem falir todos os modelos de educação escolar baseados em metáforas de “transmissão do conhecimento”, “absorção de informação”, “retenção da aprendizagem”, “seriação” como modo de hierarquizar conteúdos e “controle” como modo de hierarquizar pessoas ou papéis na sala de aula. A aula baseada nessas metáforas é restritiva e desinteressante aos propósitos de alunos e professores. A aula como metáfora faliu; porém, mesmo metáforas potencialmente mais adequadas ao mundo escolar, como aquelas inspiradas nos modelos construcionistas de todas as origens teóricas, não nos ajudarão a produzir uma ambiência educacional de alto desempenho e engajamento de alunos e professores se não forem abertas às expressões culturais contemporâneas, às formas de vida próprias dos jovens de agora, às preocupações mais comuns e atuais dos seus professores.
O centro e a periferia das manifestações mais autênticas e legítimas da juventude hoje se espelham na cultura de mídias, em arranjos sociais construídos nas redes sociais virtuais, na mobilidade da comunicação, na diversão como meio de aprendizagem. Contudo, diferentemente do mundo real fora da escola, o mundo real da escola aliena dos jovens os artefatos e atividades da cultura digital da qual são nativos. Ao retiramos sua ambiência singular de produção de sentidos, ao subtrairmos a cultura de mídias, criamos uma escola alheia aos propósitos dos jovens e cega às suas modalidades de engajamento social e aos seus modos de aprendizagem. Podemos fazer diferente em termos da produção de um novo conjunto de práticas educacionais e metáforas pedagógicas capazes de acolher o engajamento animado de alunos e professores?
Gostaria de propor quatro campos de atuação para a cultura digital no ensino médio, organizados como na figura. Trata-se da criação de cenários de aprendizagem através de plataformas imersivas, em contextos comunicativos de redes sociais, enriquecidas pela possibilidade de virtualização do conhecimento através de nuvens de aplicativos, tudo isso organizado de sorte a produzir dados que geram inteligência educacional para a escola. Comento na sequência cada um desses campos da cultura digital como vetores de inovação na escola de ensino médio.
1. Imersão: plataformas de aprendizagem
A escola, historicamente, tem-se ocupado em especial do ensino na forma da apresentação de conteúdos. Tal prática, comumente monológica, com o professor no centro da “transmissão do conhecimento” (uma das metáforas clássicas da escola), produz um divórcio entre o ensino e a aprendizagem, como se esta última fosse menos responsabilidade da escola. O contrário deveria ser o caso: a principal missão da escola deveria ser garantir a aprendizagem dos alunos, ainda que para isso fosse necessário ensinar.
Mais que isso, acredito que a missão da escola seja criar ambientes imersivos de aprendizagem capazes de fomentar o interesse dos alunos pelos conteúdos do currículo, seu engajamento em modalidades diversificadas de pesquisa e produção criativa de conhecimentos, seja valorizando o vínculo entre professores e alunos, seja fomentando novos arranjos sociais na sala de aula. Físicos ou virtuais, esses ambientes deveriam funcionar como plataformas nas quais “plugamos” inovações didáticas fundadas na cultura de mídias, cuja linguagem está no imaginário e no cotidiano dos alunos de ensino médio.
Por exemplo, o uso de processos de “gamificação” (através da aplicação de elementos do mundo dos games a processos específicos do mundo da escola) pode ajudar a transformar a vida escolar em uma aventura imersiva de aprendizagem, como o faz a escola Quest to Learn (www.q2l.org), nos Estados Unidos, ao montar aulas de todas as disciplinas com foco na ludicidade e narratividade típicas dos videogames. Ainda no campo das práticas imersivas de aprendizagem e na perspectiva das plataformas digitais, temos o poder de escalabilidade dos massive online open courses (MOOCs), cursos multimídia abertos na internet para grandes audiências, e das plataformas lúdicas de aprendizagem, com foco na construção de competências e na aprendizagem de conteúdos específicos, como é o caso, aqui no Brasil, do trabalho que realizamos com as Olimpíadas de Jogos Digitais e Educação (OJE: www.joystreet.com.br).
Em qualquer desses casos, o que está em jogo nessa dimensão é o design de ambientes instrucionais capazes de mobilizar e garantir a adesão de alunos e professores em um processo de aprendizagem rico em perguntas interessantes, argumentos plausíveis e respostas que explorem a curiosidade dos atores envolvidos.
2. Comunicação: redes sociais
A segunda dimensão trata do reconhecimento do diálogo como matriz da aprendizagem significativa e da participação legítima de alunos e professores na vida escolar. A escola é basicamente um conjunto de microrredes de interação presencial, com enorme potencial para a emergência de redes sociais virtuais distribuídas entre alunos e professores, no contexto das quais seria possível, em tese, fazer circular toda a informação e alguns processos de aprendizagem desejados pelos formuladores de currículo. O potencial existe porque, fora da escola, tanto os alunos quanto os professores já habitam muitos desses espaços de comunicação e diálogo virtualizados: o Brasil figura entre os países com maior número de usuários e de interações em ambientes como Facebook e YouTube.
Existem muitas questões em debate acerca do uso de redes sociais na escola, da manutenção da privacidade dos jovens e dos professores à eficácia como canal de ensino e aprendizagem. E existem na internet dezenas de recomendações acerca dessas questões (procure no Google, por exemplo, “facebook para educadores”). Gostaria apenas de enfatizar que se deve evitar o aproveitamento das redes sociais como (mais um) instrumento de controle dos atores da educação na escola e, caso não se usem as redes virtuais, por qualquer das questões já mencionadas, deve-se procurar ao menos apropriar-se de seu estilo comunicativo, dos memes e personagens criados pelos jovens para divertir, informar, argumentar, organizar, aprender.
3. Virtualização: nuvens de aplicativos
As estatísticas mais atuais da distribuição de smartphones e tablets e de acesso móvel à internet no Brasil são surpreendentes de uma maneira bastante positiva. Por exemplo, somos líderes mundiais no tempo de uso diário de aparelhos móveis (84 minutos contra 74 minutos da média mundial) e perdemos apenas para a Coreia no acesso médio diário aos mais diversos tipos de aplicativos para comunicação, notícias, entretenimento e educação, entre outros.
Ainda assim, da mesma forma que dificultou a entrada do Tamagotchi no Brasil na década de 1980, a escola hoje se esforça para limitar o uso da computação móvel em seus espaços, enclausurando os jovens nos já ultrapassados “laboratório de informática”. Conectados a uma rede Wi-Fi e providos da função “modo avião”, que bloqueia a comunicação via ligação telefônica e o recebimento de mensagens por SMS, esses aparelhos podem tornar-se instrumento de uma aventura educacional sem precedentes na escola, funcionando ao mesmo tempo como “veículo” e “sonda” da jornada que articula professores, alunos e conhecimentos.
Como veículo, esses recursos são capazes de conduzir os atores dos sistemas de educação às plataformas de aprendizagem e comunicação. Existem milhares de aplicativos úteis à escola e ao ensino (ver, por exemplo, esses poucos, mas muito interessantes, no link bit.ly/escolapps), em torno dos quais podemos montar incontáveis novas práticas didáticas de apoio à aprendizagem (ver, por exemplo, o uso do acelerômetro de smartphones em uma atividade sobre força centrípeta em bit.ly/escolapps1 e bit.ly/escolapps2).
Como sonda, essas ferramentas podem devolver-nos o rastro de aprendizagem deixado pelos usuários dos sistemas de informação, com o qual criamos inteligência educacional, marcado no círculo central da figura e discutido a seguir.
4. Inteligência educacional
Finalmente, como parte da arquitetura necessária ao entendimento e reinvenção inovadora dos processos de ensino e aprendizagem na escola, coloquei no centro as atividades de monitorar e gerar novos conhecimentos acerca de todas as outras atividades de alunos e professores nas camadas de imersão, comunicação e virtualização. Realizada com base em algoritmos proprietários e sob a tutela de conceitos da moda como Big Data, ou realizada com o apoio de instrumentos de análise de dados disponíveis na internet (como o Qedu em www.qedu.org.br), o importante nessa dimensão está na capacidade de agir rapidamente em função da atividade dos alunos e professores nas plataformas de aprendizagem, nas redes sociais e nas nuvens de aplicativos que formarão os novos sistemas de educação.
Uma arquitetura de escola baseada nas dimensões antes discutidas pressupõe um processo contínuo de inovação. Em educação, os processos de inovação deveriam estar vinculados principalmente à criação de ambientes que incentivem a criatividade, a imaginação, a experimentação, a exploração engajada e desejante, capazes de capturar a atenção e o imaginário de alunos e professores. Assim, a inovação na escola pode ser realizada na forma de aulas que acontecem em redes sociais ou, bem ao contrário, pela abolição da aula como arranjo social adequado à aprendizagem.
Por isso, tenho convidado alunos e educadores para o que chamo “hackear a escola”, ou seja, criar plataformas diferenciadas e contextualmente relevantes para a aprendizagem, que apoiem a emergência, em escala, de novos arranjos sociais para a educação. Os requisitos para tal empreendimento incluem desde uma gestão preparada para entender as demandas e tendências de uma cultura digital cada dia mais entranhada no cotidiano dos jovens até a habilitação dos professores à escuta e ao diálogo com seus alunos, passando por questões bem mais simples, como o provimento de banda larga em rede Wi-Fi e de programas tecnológicos do tipo BYOD (bring your own device), que incentivam na escola o emprego dos artefatos de que o jovem já dispõe e dos quais faz uso fora dela.
Penso que a transição de uma escola da manutenção de pressupostos e metáforas seculares para uma escola da reinvenção de sua arquitetura pedagógica e institucional poderia empregar diferentes tipos de inovação para diferentes partes da atividade escolar, num modelo do tipo 70-20-10, que poderia iniciar assim no ano 1:
- aumentar continuamente a eficiência e promover a eficácia de 70% das ações que já praticamos;
- substituir 20% de nossas práticas atuais por outras já validadas na pesquisa acadêmica ou na experiência de outros educadores;
- transformar radicalmente 10% dos métodos, conteúdos e arranjos didáticos e interacionais empregados, inclusive com inspiração nas práticas de sucesso em ambientes essencialmente não escolares (do mundo profissional das startups tecnológicas aos mundos virtuais imersivos dos videogames, por exemplo).
Se procedêssemos assim, a cada ano transformando entre 10 e 20% das nossas práticas educacionais, em cerca de cinco anos teríamos transformado profundamente a escola em direção ao atendimento das demandas de seus principais usuários: alunos, professores, famílias e gestores educacionais.
- Luciano Meira é doutor em Educação Matemática, professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e pesquisador associado da JoyStreet. luciano@meira.com
Fonte: https://www.grupoa.com.br/revista-patio/artigo/9902/cultura-digital-e-ensino-medio.aspx